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A democracia depende da participação dos mais jovens

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AutorPatricia BlancoPresidente do Palavra Aberta Sobre o autor

Pesquisa recente mostra que a confiança deles nesse sistema está em xeque

O tema deste ano do Dia Internacional da Democracia – “Capacitando a Próxima Geração” –, celebrado nesta sexta-feira (15) em todo o mundo, não poderia ser mais oportuno. Dentro de uma ampla ideia de democracia inclusiva para o desenvolvimento sustentável, o mote, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), centra-se no papel das crianças e dos jovens na salvaguarda da democracia, hoje e no futuro, diante de uma série de ameaças chanceladas pela desinformação e pela prática de ódio semeadas no universo online que, de forma nociva, contaminam o cotidiano real da humanidade. 

Este papel nunca foi tão importante, uma vez que a confiança dos jovens em relação aos processos democráticos também está em xeque. Segundo reportagem desta Folha de S.Paulo, pesquisa global conduzida pela Open Society Foundations revelou que o apoio à democracia no mundo é amplo – 86% dizem preferir viver em um Estado democrático –, mas o índice despenca em se tratando dos jovens. 

Entre os entrevistados de 18 a 35 anos, 57% consideram a democracia preferível em relação a outros tipos de governo; o percentual vai a 71% em faixas etárias mais velhas. Ao mesmo tempo, mostra a reportagem, 42% dos jovens acreditam que um regime militar seja uma forma correta de governo, e 35% desse grupo etário acham que um líder forte que não se preocupa com eleições seja um caminho positivo para o governo. 

“Nossas descobertas são preocupantes e alarmantes. Pessoas ao redor do mundo ainda querem acreditar na democracia. No entanto, a cada nova geração, essa fé diminui enquanto aumentam as dúvidas sobre sua capacidade de trazer melhorias concretas à vida das pessoas”, afirma Mark Malloch-Brown, presidente da Open Society Foundations.

Esses resultados mostram com clareza que estamos desafiados a uma tarefa urgente. Segundo o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, o momento é de tensão e turbulência. “Os muros estão se fechando nos espaços cívicos”, diz ele em mensagem especial para o Dia da Democracia. De acordo com Guterres, a desinformação tem envenenado o discurso público, polarizado as comunidades e minado a confiança nas instituições. Acompanhamentos feitos por organizações especializadas reforçam a preocupação da ONU. 

O relatório anual do Instituto V-Dem referente a 2022 indica que, pela primeira vez em 20 anos, há mais ditaduras do que democracias plenas. Conforme o documento, no final do ano passado, havia um número recorde de países se autocratizando: 42 contra 33 em 2021. O estudo aponta que praticamente 72% da população mundial — 5,7 bilhões de pessoas — vivem em autocracias. Outra conceituada organização, a Freedom House indica que a liberdade global retrocedeu, em 2022, pelo 17º ano consecutivo.

Em meio a esse cenário, há uma equivocada percepção de que crianças e jovens nascidos no meio digital não precisam desenvolver habilidades para identificar as maledicências espalhadas na internet — como se elas lhe fossem inatas. Pesquisas recentes revelam o contrário. Minucioso estudo realizado pela Universidade de Cambridge e pelo instituto de pesquisas YouGov nos Estados Unidos ao longo de dois anos, por exemplo, descobriu que dois terços (66%) das pessoas mais velhas, com idade superior a 65 anos, conseguiram identificar pelo menos 14 questões de um teste que continha 20 informações verdadeiras e falsas, informou o MediaTalks. Segundo a pesquisa, o índice desse nível de acerto foi caindo na medida em que passava para faixas etárias mais novas: 60% entre os entrevistados de 45 a 64 anos, 35% dos adultos de 30 a 44 anos e somente 28% entre 18 e 29 anos.

Precisamos investir de forma maciça, conforme recomenda a ONU, na educação de nossas crianças e jovens, dando a elas a oportunidade de participação na construção de soluções para os inúmeros problemas que enfrentamos atualmente e que vem fragilizando os processos democráticos em todo o planeta.

É necessário capacitar as gerações mais novas para as virtudes da cidadania, para o diálogo com pessoas de diferentes pontos de vista, o exercício das liberdades civis e para o respeito aos direitos humanos, à pluralidade e à equidade para que elas entendam a dimensão e a importância da diversidade e da tolerância. Educação para democracia já!

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Patricia Blanco

Presidente do Palavra Aberta