A notícia do falecimento do Papa Francisco, morto na madrugada da última segunda-feira (21), aos 88 anos, gerou grande comoção mundial e a necessidade de refletirmos sobre a importância do seu legado, que inclui posições importantes sobre liberdade de expressão e pensamento crítico diante das novas tecnologias.
O seu papado é apontado por muitos especialistas como reformista, de estilo pastoral e simples, missionário, humilde, acolhedor, descentralizador, atento para os desafios da atualidade e voltado para maior inclusão e melhor transparência da Igreja Católica, que reúne em todo o mundo cerca de 1,4 bilhão de fiéis, 17,5% da população global.
Ganhou por isso uma legião de fãs para além dos católicos e outros tantos desafetos, em especial entre os setores mais conservadores da Igreja que se posicionaram contrários a um discurso papal mais aberto a divorciados, a homossexuais (“São filhos de Deus e têm direito a uma família“), à igualdade de gênero (“Quem leva o mundo adiante são as mulheres”), e a maior presença feminina no Vaticano.
O Papa Francisco se tornou uma figura central para o planeta ao promover o constante diálogo sobre os principais temas que afligem a humanidade, combatendo as desigualdades, a intolerância, a violência, o ódio e, ao mesmo tempo, defendendo a justiça, a paz e as liberdades religiosa, de pensamento, de expressão, de imprensa e de respeito pela opinião dos outros, sempre com responsabilidade, além de ter se engajado no combate à crise climática, chamar a atenção do mundo para o drama vivido pelos refugiados e alertado para os riscos do mau uso da tecnologia, com ênfase para a Inteligência Artificial Generativa (IAGen).
Com voz serena e humanista, muitas vezes exibindo um invejável bom humor, Jorge Mario Bergoglio enfrentou uma realidade global muito adversa ao que pregava. Cada vez mais regimes autocráticos – 5,7 bilhões de pessoas (71% da população global) vivendo em ambientes cuja tendência é de privação de liberdades e de direitos fundamentais, segundo o Instituto V-Dem – e conflitos armados: mais de 120, de acordo com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV). O resultado disso é uma alarmante carnificina.
Com a mesma intensidade, o Papa defendia a liberdade de expressão como um direito humano fundamental, essencial para uma sociedade democrática e pluralista. “A informação livre, responsável e precisa é o tesouro do conhecimento. Sem ela, corremos o risco de não saber diferenciar a verdade da mentira. Sem ela, nos expomos a preconceitos e polarizações que destroem laços”, disse Francisco no começo deste ano ao se reunir com comunicadores de 138 países.
Sempre na vanguarda dos grandes temas, o Papa também não se esquivou de abordar suas preocupações com o rápido avanço tecnológico. Para ele, as novas tecnologias, sobretudo a IAGen, têm enorme potencial para trazer benefícios à humanidade, mas desde que cercadas de responsabilidade e ética, a serviço do bem comum e acessíveis a todos. Do contrário, no seu entendimento, a inteligência artificial pode exacerbar desigualdades.
Francisco defendia a regulação algorítmica e a importância do desenvolvimento do pensamento crítico. “Não se deve permitir que os algoritmos determinem como entendemos os direitos humanos, que deixem de lado os valores humanos essenciais de compaixão, misericórdia e perdão, ou que eliminem a possibilidade de um indivíduo mudar e deixar seu passado para trás”, escreveu em sua mensagem anual para o Dia Mundial da Paz de 2024.
Não é de se estranhar que uma das frases mais marcantes de Bergoglio conclama a “derrubar muros e construir pontes” capazes de aproximar os diferentes sob qualquer aspecto. Para tanto, ele defendia a promoção da “cultura do encontro”, na qual “vivenciarmos os outros em sua diversidade, somos encorajados a sair de nós mesmos e a aceitar e abraçar nossas diferenças”.
Que os ensinamentos de Francisco não se percam e sigam contribuindo para que a humanidade encontre a paz e o desenvolvimento sustentável com base nos direitos humanos, nas liberdades e na plena participação social.